É inegável que os animais de estimação fazem parte da família de muitas pessoas atualmente. No entanto, essa conexão emocional entre humanos e seus bichos de estimação não é novidade.
Há evidências arqueológicas sugerindo que os vikings tinham um apreço elevado, até mesmo íntimo, por seus animais, levando-os em suas jornadas pelo mar. E, mais recentemente, evidências científicas comprovaram que, já no Século IX, os vikings levavam cavalos, cães e outros animais através do Mar do Norte.
Até então, a suposição predominante era que as tropas vikings empreendedoras adquiriam cavalos (junto com outros itens de saque) durante suas incursões nas Ilhas Britânicas.
No entanto, essas descobertas sugerem que a profundidade dos relacionamentos que as pessoas da era viking tinham com os animais foi drasticamente subestimada. Mas, por que isso aconteceu?
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Afinal, a grande maioria das pessoas — sejam escandinavas ou de outras regiões — que viveram durante a era viking dependiam da agricultura para sobreviver. Por que demorou tanto para os pesquisadores perceberem que os seres humanos e os animais sustentavam relacionamentos profundos, complexos, emocionais e mutuamente enriquecedores?
As sociedades do passado tinham visões diferentes sobre a importância de humanos, animais e objetos. Alguns humanos podiam ser considerados propriedades, até mesmo objetos, valendo muito menos do que certos animais.
Em nossa pesquisa, utilizamos tanto a arqueologia quanto textos para mostrar que alguns cavalos em comunidades como as da Escandinávia e da Islândia da era viking podiam ser vistos como "pessoas" em si mesmos e dignos de tratamento cuidadoso e deliberado.
Cavalos em sepulturas humanas
Os cavalos na era viking eram vistos como criaturas liminares, ou seja, capazes de cruzar fronteiras físicas e conceituais, viajando por diferentes terrenos e até mesmo entre mundos. Eles também tinham significado cosmológico.
A poesia nórdica retrata o Deus Odin (Óðinn) montado em seu cavalo de oito patas, Sleipnir, em sua jornada à terra dos mortos. Uma bráctea — pingente — do Século V recém-descoberta na Dinamarca, com uma inscrição rúnica, pode também sugerir uma associação entre Odin (ou pelo menos alguém que se identificava como o "homem de Odin") e um cavalo.
Historicamente, corpos de cavalos em sepultamentos da era viking foram interpretados como símbolos da jornada para a vida após a morte, parte dos pertences do falecido no além, ou como símbolos de status. Mas essas interpretações deixam de captar algo vital — o vínculo entre o cavalo e o cavaleiro.
Cavalos têm relações especiais com seus cavaleiros, pois ambos têm que aprender a trabalhar juntos. Na poesia nórdica (algumas delas ligadas à era viking), os cavalos eram uma parte vital da identidade dos guerreiros.
Poemas lendários sobre os heróis Helgi e Sigurd (Sigurðr) retratam heróis quase inseparáveis de seus cavalos. Grani, o cavalo de Sigurd, o matador de dragões, é retratado em luto após sua morte.
Evidências de parcerias entre humanos e cavalos foram encontradas em sepultamentos em todo o Norte da Europa, desde os grandiosos navios funarários de Ladby e Gokstad, até os sepultamentos equestres da Dinamarca do Século X, passando pelas sepulturas mais modestas de humanos e cavalos na Islândia da era viking. Entretanto, os cavalos não eram apenas enterrados com os homens.
Em Trekroner-Grydehøj, em Sjælland, Dinamarca, uma mulher foi enterrada com um cavalo ao seu lado, com uma das patas do animal parcialmente sobrepondo o corpo humano. Algo sobre essa mulher e esse cavalo tornou a disposição apropriada.
Acredita-se que a mulher fosse uma especialista em rituais, possivelmente uma feiticeira (seiðkvinna), enterrada com uma haste de cobre com ponta de ferro e uma série de outros objetos, incluindo algumas facas, um balde e uma pequena caixa de madeira.
Uma grande pedra plana, um cachorro partido ao meio e alguns ossos de ovelha, bem como alguns pinos de ferro (possivelmente para prender bagagens a uma sela) e uma corrente de cachorro completaram o sepultamento.
Em Løve, em Vestfold, Noruega, um sepultamento do Século X também apresenta um cavalo ao lado de uma mulher. Assim como a mulher em Trekroner-Grydehøj, acredita-se que ela tenha sido uma especialista em rituais.
No entanto, a mulher não foi a única enterrada com as ferramentas de seu ofício. Um anel de ferro (com anéis menores anexados a ele) foi colocado no peito do cavalo enterrado ao lado dela.
Quando fixados nas rédeas ou arreios de uma carruagem, os anéis metálicos produziam um som de tilintar. Acredita-se que tenha tido um papel nos rituais da era viking.
Essas mulheres foram enterradas com esses cavalos por que eles eram especiais para elas? Ou por que eram feiticeiras? Ou será que ser uma feiticeira envolvia relacionamentos estreitos com esses animais? Acreditamos que, entre outros rituais, os cavalos parecem ter sido participantes vitais nos processos e práticas funerárias.
Bons para morrer, bons para viver
Pesquisas mostram que os relacionamentos com cavalos têm uma série de benefícios, especialmente para os jovens.
É interessante notar que há uma insistência repetida na poesia nórdica e nas sagas medievais de que os jovens homens deveriam praticar a higiene e o treinamento de cavalos. Os cavalos são considerados parceiros na agricultura e, frequentemente, até mesmo membros das famílias nesses textos.
A saga do Século XIII, Bjarnar Saga Hítdœlakappa, até mesmo retrata uma mulher que parece se beneficiava de uma terapia assistida por cavalos, encontrando alívio de sua enfermidade ao montar em seu cavalo, enquanto ele era conduzido ao redor de um campo:
O maior alívio foi proporcionado a ela ao montar no cavalo, enquanto Þórðr o conduzia de um lado para o outro, e ele fez isso, mesmo que isso lhe causasse grande dor, pois queria tentar confortá-la.
Em tempos de agitação ecológica, olhar para o passado para entender os relacionamentos que os seres humanos tiveram com os animais pode inspirar abordagens diferentes para o presente e o futuro.
Dada a recente vitória de ativistas maoris concedendo personalidade jurídica e direitos a um rio, buscar analogias históricas, como a dos vikings e seus cavalos, pode nos incentivar a continuarmos buscando relacionamentos mais responsáveis com o mundo “não-humano”.
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FONTE: The Conversation
ADETUNJI, Jo. Shared horse and human burials show how deeply the vikings cared for their animal companions. The Conversation. Carlton, 02 de ago. de 2023. Disponível em: <https://theconversation.com/shared-horse-and-human-burials-show-how-deeply-the-vikings-cared-for-their-animal-companions-209185>. Acesso em: 03 de ago. de 2023. (Livremente adaptado pela Livros Vikings)
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